02/03/2008

Revolver . The Beatles

Para George Harrison, esta não é mais que a parte dois de Rubber Soul uma vez que são albuns deveras similares na sua concepção. Permitam-me discordar de Sir Georgie, mas a meu ver estamos na presença Rubber Soul + 1. É sem dúvida mais eléctrico e mais eclético e, embora não tenha hinos como In My Life, é mais regular na qualidade. Apesar de, pessoalmente, não ter qualquer preferência entre um e o outro, considero este um produto mais coeso, mais pretensioso e ainda mais adulto. Eis o rock em territórios inexplorados até então.











Revolver, 1966







A modernidade ataca logo com "Taxman", onde George se volta a superar e onde a secção rítmica é absolutamente brilhante (especial atenção ao baixo). Uma ode aos roubos do Estado, onde a personalidade é vincada na guitarra solista, que acompanha toda a música. Esta guitarra já se tinha visto nas anteriores obras de George, e é muito característica sua.
Segue-se um caminho totalmente novo, "Eleanor Rigby". Uma das mais importantes peças de Paul Mccartney. Orquestra de cordas e voz, ingredientes mais do que suficientes para criar uma atmosfera triste, densa e de fortes emoções. Absolutamente marcante.
Pessoalmente uma das minhas favoritas, "I´m Only Sleeping" fala sobre os prazeres de dormir, e na distância que se sente em relação à realidade do mundo quando se viaja durante o sono. É uma canção que nos envolve na sua simplicidade, que nos aconchega na sua cor e vibrância. A voz de John é absolutamente encantadora e a honestidade do pedido que nos faz é encarecedora. Obviamente que não se podia deixar de referir o solo de guitarra invertida, cuja ideia surgiu por acidente, mas que mostra a vontade de explorar novos sons e novas maneiras de fazer música. E resulta, tal como toda esta faixa.
"Yellow Submarine" dispensa qualquer tipo de apresentação, e "Love You To" é para mim uma obra indiana menor comparada com a que George mostraria em Sgt.Peppers. No meio destas duas há, no entanto, uma música que em muito lembra Rubber Soul. "Here, There and Everywhere" em nada fica a perder para as composições mais doces do albúm anterior. Paul Mccartney tem realmente um poder qualquer em fazer composições que nos fazem sentir felizes. Quente, serena e tremendamente romântica.
"She Said" é outra obra prima. Uma das melhores letras, numa das melhores baterias, numa canção que muda de ritmo a cada segmento, mas que ao mesmo tempo nunca perde integridade e algum exotismo. Se AINDA havia dúvidas acerca da genialidade de John Lennon como compositor, elas desapareceram aqui.
De "Good Day Sunshine" não sou particularmente fã, apesar do seu optimismo inabalável, não considero que seja particularmente interessante, mas de "Your Bird Can Sing" sou, especialmente na forma como nos agarra imediatamente com aquele duplo riff e nos leva a fazer uma curta viagem. A letra não é muito interessante, mas o alegre clima fala por si.
"For No One" é uma triste música sobre a dificuldade em acabar uma relação, e a dificuldade em quebrar a ligação sentimental com a pessoa que se ama. A composição é interessante e serve de bom tónico para quebrar o optimismo das músicas anteriores.
Mas "Dr. Robert" sim, é verdadeiramente interessante. Primeiro porque é sobre um médico que prescreve drogas, depois porque se ouvem harmonias vocais completamente novas, e um segmento ("Well, well, well, you´re feeling fine") que remete para o uso das referidas drogas. Tematicamente abriam-se anda mais os horizontes.
"I Want To Tell You" é o perfeito exemplo de música a acompanhar a letra. Apesar de não gostar muito, admiro a forma como a falta de auto confiança, a dúvida são acompanhadas por aquelas inversões no piano e pela desarticulada harmonia vocal que complementa a narrativa.
Outra música tradicional de Paul Mccartney é "Got to Get You Into My Life", de que, francamente, não são fã, a não ser que esteja alcoolizado. É daquelas músicas interessantes de ouvir só por ouvir, num dia triste. Exactamente o contrário de "Tomorrow Never Knows", a única música escrita sobre uma "trip", sempre na mesma nota, e com os seus inúmeros elementos, algo aleatórios que nos remetem para a mente caótica de quem está, exactamente, no meio de uma viagem alucinogénica. A letra é inspirada no "Tibetan Book of the Dead", de Timothy Leary, o padrinho do LSD. Apesar de parecer sempre igual, há pormenores a reter, como os pratos na bateria de Ringo e a produção na voz de John. Uma das músicas mais revolucionárias do seu tempo.

Revolver é, sem dúvida, o passo lógico a dar depois de Rubber Soul. Mais experimentação, uma sonoridade mais moderna, novas temáticas e, sobretudo, a mesma qualidade musical, o mesmo appeal, a mesma capacidade de entreter e fascinar ao mesmo tempo. Considerado por alguns como o melhor album de todos os tempos, esta é, sem qualquer dúvida, a confirmação da genialidade criativa de uma banda que se construiu à volta de conceitos passados, e se catapultou definitivamente para o futuro com obras deste calibre. E melhor ainda estaria para vir.

3 comentários:

Anónimo disse...

Olá de novo!!

Atenção, que o disco é de 66... ;-)

Foi precedido do single "Paperback Writer / Rain". De todas as músicas (single + Revolver), acho que eles só chegaram a tocar ao vivo "Paperback Writer".

Falando do single, acho que "Rain" é uma música do caraças: bateria espectacular (Ringo é um génio), baixo com um som incrível, guitarras fixes... E no fim, o profético "sdaeh rieht edih dna nur yeht semoc nair eht fI" de Lennon. Muito boa, mesmo.

Quanto ao disco, é como eu digo: comecei a ouvir os discos deles, desde Rubber Soul até Let It Be, por ordem cronológica, e tirando o Yellow Submarine e o Let It Be, depois de ouvir cada um deles dizia sempre: "Não, este é que é o melhor disco que já ouvi."

Por isso...

Luís, Porto

O Bom. disse...

Obrigado pelo comentário, aliás, pelos comentários! É bom saber que alguém lê com atenção :)

E obrigado também pela correcção. É, sim, de 66.

Eu vou fazer um post dedicado às obras que não estão nos albuns mais importantes, nomedamente essas duas, Strawberry Fields Forever, I Am The Walrus, Hey Jude etc... mas por antes disso ainda vem o White Album, e ANTES disso ainda quero ver se saio um bocadinho do tema Beatles ;)

Comigo também foi um pouco assim, embora eu tenha logo saltado para o Sgt.Peppers e ouvido os outros posteriormente... mas cada coisa que ouvia, depois de perceber o seu contexto, me fascinava de forma diferente, e acho que é essa a magia dos albuns dos Beatles.

A minha mãe é que disse e muito bem: "Mais tarde ou mais cedo, toda a gente se apaixona pelos Beatles."

E eu tenho idade para ser neto de qualquer um deles.

Anónimo disse...

Também eu tenho idade pra ser neto deles (tenho 24). ;-)

Eu já conhecia alguns originais deles, de um "best of" de 66, chamado Oldies but Goldies. Ou seja, a era de estúdio deles tava mt mal representada (e mesmo a era dos concertos também) nesse disco.

Já sabia que eram míticos, mas não conhecia muito deles. Há coisa de 2 anos, comecei a comprar os discos a partir de Rubber Soul, para conhecer melhor a banda que tão propaladamente inspirou os Oasis, que eu julgava geniais até então.

A partir daí, dá pra adivinhar o resto da história. Embora continue a achar Noel Gallagher um génio, ele teve foi azar nos gajos que arranjou pra fazer banda(s). Assim, não dá pra elevar os Oasis à categoria de mitos.

Abraço.