08/04/2007

O Neo-Pseudo-Salazarismo.

Foi sem surpresa que o mal afamado concurso "Os Grandes Portugueses" teve um final dramático. Foi também sem surpresa que os dois candidatos mais recentes foram aqueles que ocuparam os dois primeiros lugares.

Dadas as características destes dois candidatos, isto revela duas coisas.

Ainda existe, bem no âmago da sociedade portuguesa, uma grande cisão entre dois blocos antagónicos, nascida no pós 25 de Abril, que põe frente a frente forças revolucionárias de cariz socialista e forças conservadoras de direita. Este confronto arcaico é dolorosamente evidente na diferença de pontuação entre Salazar e Cunhal e os restantes candidatos, e a explicação é simples. A partir do momento em que um deles se revelou como forte candidato, os detractores da sua obra (e não necessariamente seus apoiantes) uniram-se em bloco para apoiar o candidato da outra "facção".


Não costumo apoiar Paulo Portas nas suas palavras ou acções, mas a constatação deste "picanço" televisivo foi particularmente pertinente no calor da discussão dos resultados.

Depois, e mais gravosamente, revela um completo desinteresse pelas REAIS grandes figuras da nossa história, e, consequentemente, pela cultura colectiva riquíssima que temos como povo. Não negligenciando a importância das duas figuras em questão, e especialmente da sua enorme relevância política no século XX, há que ter em atenção que somos um povo com quase 900 anos de existência e que, nesse portentoso intervalo de tempo, houve figuras BEM mais marcantes e influentes.
Muitos atribuirão este resultado a um protesto simbólico pelo estado das coisas, que, dizem alguns, estão pior do que no pré 25 de Abril. Eu atribuo, realmente, este resultado a uma das mais graves falhas do período pós revolucionário, a Educação. Como é possível que, 30 anos depois, ainda haja um povo com tão pouco discernimento, tamanha falta de inteligência e sensibilidade, e copiosa ignorância cultural que vá votar maioritariamente numa personalidade que remeteu o nosso país ao isolamento económico, cultural e social durante 40 anos. É uma acefalia colectiva digna dos mais relevantes anais sociológicos.

É que estamos a falar da pessoa que disse que : "Um povo culto é ingovernável.".

É portanto perfeitamente compreensível a fidelidade de tanta gente estúpida.

2 comentários:

Bruno disse...

Já sei que a esta altura sou o 537.º visitante do blog.

Relativamente ao falhanço na educação do nosso povo, onde eu me incluo em todas as suas qualidades e defeitos, concordo em pleno. A nós falta a real noção da grandeza e da longevidade da nossa História, especialmente após o 25 de Abril, quando "Pátria" passou a significar "Fascismo". Mas concordo também com outras vozes que referiram que sobre o século XX não existe um distanciamento histórico suficiente e que este foi quase insignificante na grandeza do nosso país. Um povo que num âmbito deste programa alimenta querelas ideológicas por trás de duas figuras que pouco significado tiveram na História de Portugal é realmente um povo com cultura de "A bela e o mestre" e de "Paixões Proibidas". Isto porque, a meu ver, se alguém devia estar nos primeiros 10 no século XX para além de Aristides, esse alguém seria tão só Salgueiro Maia. Mas mesmo assim acho que o século XX esteve demasiado presente nos 10 primeiros.
Quanto ao protesto... EXTREMAMENTE RIDÍCULO. Mesmo tratando-se de tal, não deve ser levado a sério. Um protesto realmente digo de tal designação implica desconforto para quem protesta, não pegar no telefonezinho e, manifestando algum desprezo para com 0,60€, votando no António, porque não há par para dançar. Se o povo quer realmente protestar quanto ao estado de governação, largue o traseiro do sofá ou da praia e manifeste a sua vontade ou ausência desta nas urnas, altura na qual a sua opinião realmente conta num estado democrático e possibilitado pela revolução de 1974.

Abraço

genoveva disse...

ora aqui está um tema em que me sinto relativamente á vontade =) mas ainda espero ver umas coisinhas sobre arte.

Este programa trouxe muita discussão e claro está polémica. É necessário dizer também que apesar de tudo divulgou personalidades esquecidas no tempo, e que tanto contribuiram para o presente. fica sempre o bichinho "quem foi ribeiro sanches? o que fez?...será ele comparável com...?", o problema é que nao deve haver qualquer tipo de comparação entre personalidades, isso cabe unicamente a eduardo lourenço.
Quanto ao derby: cunhal e salazar, penso que quando os portugueses votaram em cunhal pensaram nele como um representante da resistência "anti-fascista" em Portugal, se se poderá chamar regime fascista, visto que ainda paira a questão da sua existencia ou nao em Portugal. Na realidade cunhal nao foi o unico resistente! o partido comunista nem sequer foi o único a fazer frente à ditadura, até porque nos anos 60 emergiram muitos mais partidos da dissidencia devido á falta de organizaçao do PC. os portugueses é que não percebem o que viveram nem o que estão a viver, muito menos que é necessário um certo afastamento temporal e emotivo.
este programa/concurso devia cingir-se a factos, e não a nacionalismos distorcidos e ao saudosismo de Teixeira de Pascoaes.
esse dito saudosismo não vai trazer um país (no futuro) como o que foi no passado. Esqueçam o V império! Esqueçam Salazar nesses termos! Foi um grande ministro das finanças e não era parvo de todo, muito inteligente, sim. Mas será o grande portugues?

Crenças, mitos ou saudosismo?

hum...